2012/05/30

Bons tempos mas difíceis.



Velho burocrata, meu amigo aqui presente, nunca houve quem te ajudasse a evadir-te, e a culpa não é tua. Edificaste a tua paz, à força de tapares com cimento, como as térmitas, todas as saídas para a luz. Rebolaste-te na tua segurança burguesa, nas tuas rotinas, nos ritos asfixiantes da tua vida provinciana; ergueste essa humilde muralha contra os ventos, contra as marés, contra as estrelas. Não queres a inquietação dos grandes problemas e muito te esforçaste por esquecer a tua condição de homem. Não és o habitante de um planeta errante, não te pões questões sem resposta tu és um pequeno burguês de Toulouse. Ninguém te sacudiu pelos ombros quando era tempo ainda. Agora, a argila de que és formado secou, e endureceu, e ninguém seria capaz, de futuro, de acordar em ti o músico adormecido, ou o poeta, ou o astrónomo, que talvez te habitasse de início.Sendo superior, nunca repreendas ninguém com ira, mas só depois de ela passar. Assim, a repreensão será mais proveitosa. A realização mútua dos nossos sonhos não é nenhum elemento básico do casamento, mas sim a valentia de aceitar sempre, de novo, uma pessoa que com o correr do tempo vai actuando de maneira diferente dos meus ideais. O que devemos quebrar, especialmente quando surge uma crise, não é o casamento, mas os nossos sonhos e ilusões irreais. O amor conjugal é, sem dúvida, um amor exclusivio, mas que abraça ao mesmo tempo toda a humanidade. É exclusiva na medida em que cada um se pode unir com toda a intensidade somente a uma pessoa. Mas quando amo verdadeiramente uma só pessoa, o coração torna-se grande e proporciona a faculdade de me dedicar a muitas mais. Uma pessoa necessita de toda uma vida para amadurecer. Requer a ajuda dos outros e, se está casada, especialmente a do seu cônjuge.
 O homem necessita do apoio da sua mulher, e a mulher do seu marido, para desenvolver todas as suas capacidades.A fidelidade, naturalmente, tem que ver com a sexualidade, mas não se limita a ela. Implica a aceitação de ambos em todas as dimensões da sua personalidade. Normalmente, a fidelidade está presente na vida matrimonial quotidiana de uma maneira calada e pouco visível, consistindo numa constância tanto nos bons tempos como nos difíceis. É preciso a ajuda do outro, sobretudo face à monotonia diária que pode consistir nas obrigações familiares e profissionais. Mas também se requer quando se fracassa, se duvida de si mesmo ou por acaso se falhou. “Sê solidário com os teus amigos, sobretudo quando são culpados”, diz um provérbio francês. Quando alguém está prestes a cair no mais fundo da miséria, não é precisamente o parceiro aquele que, em primeiro lugar, deve lutar para ir com ele?
Não preciso de amigos que mudem quando eu mudo e concordem quando eu concordo. A minha sombra faz isso muito melhor. Quando vires um gigante, repara bem na posição do sol, não vá acontecer que se trate da sombra de um pigmeu. 
Quando vires um homem bom, tenta imitá-lo; quando vires um homem mau, examina-te a ti mesmo. É urgente repetir isto até que seja entendido: a fraternidade, o amor, a entrega, não são bens de acréscimo para o homem ser santo ou perfeito. São a essência do homem. O homem como indivíduo solitário não é homem. O homem só é homem quando vive em comunidade e para a comunidade. Quando serve a alguém. Quando ama alguém. Só então é que nasce como ser humano.

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